sexta-feira, 21 de março de 2008

DIA DA POESIA: os tempos mudam, mas a poesia perdura

João Roiz de Castelo-Branco, Cancioneiro Geral (século XV): Senhora, partem tão tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida. Partem tão tristes, os tristes,
tão fora de esperar bem
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
Manuel Alegre
Amor de fixação "A experiência é madre das coisas e por ela soubemos radicalmente a verdade" (Duarte Pacheco Pereira, "Esmeraldo") Há um caminho marítimo no meu gostar de ti.
Há um porto por achar no verbo amar
há um demandar um longe que é aqui.
E o meu gostar de ti é este mar.
Há um Duarte Pacheco em eu gostar de ti.
Há um saber pela experiência
o que em muitos é só um efabular.
Que de naugrágios é feita esta ciência
que é eu gostar de ti como um buscar
as índias que afinal eram aqui.
Ai terras de Aquém-Mar (a-quem-amar)
naus a voltar no meu gostar de ti:
levai-me ao velho pinho do meu lar
eu o vi longe e nele me perdi.
Natália Correia
Fiz um conto para me embalar
Fiz com as fadas uma aliança.
A deste conto nunca contar.
Mas como ainda sou criança
Quero a mim própria embalar.
Estavam na praia três donzelas
Como três laranjas num pomar.
Nenhuma sabia para qual delas
Cantava o príncipe do mar.
Rosas fatais, as três donzelas
A mão de espuma as desfolhou.
Nenhum soube para qual delas
O príncipe do mar cantou.
Ana Salomé
elevação de tom és toda a minha raridade
o sal que acrescento ao ouro
o anel sobre a minha colina de fogo
o círculo por onde passa um leão em brasa
de tanto querer o teu sobre tudo e nada.
se chegares, traz a escansão à solta
não te preocupes se me beijares e a lua não eclodir
na tua boca de incêndio.
os sinais
nascem do chão sem precisar de ser primavera,
por o caminho ser claro de cometas:
a lua rola até à superfície de outro universo
para onde te convido num copo de vinho.
não feches os olhos senão no tempo do beijo
e depois fecha a porta do vento, por favor.
imagina a brancura da paz só aí
quando passares a mão pelo meu pescoço
e sentires o calor de um sol quase perfeito.

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