quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

"Memorial do Holocausto" por Pedro Meneses

A propósito do Dia Europeu em Memória do Holocausto (27 de Janeiro), um texto muito interessante que o Pedro gentilmente enviou para o nosso blogue:

«Este Memorial do Holocausto, constituído por 2700 monólitos de betão, concebido pelo arquitecto Peter Eisenman e pelo escultor Richard Serra, situado em pleno centro de Berlim, perto do Reichstag, o parlamento alemão, publicamente apresentado em 2004, recria, e representa, todo o sofrimento dos que padeceram nas mãos da Alemanha nazi. Representa por isso uma chaga, que assegura o sentimento de culpa europeu. Nesse sentido, é absolutamente simbólico, ao chegar às vísceras de quem o observa – como, de resto, todo o símbolo chega. É uma evocação da História, que, apesar da sua monumentalidade, ou antes por causa dela, ataca ironicamente a instituição «monumento», como dela se apropriara a Alemanha nazi. Aqui, o monumento chama-nos à razão, apela à réstia de humanidade que avultará no sublime, pelo medo que esta provoque. Dizia o filósofo britânico Edmund Burke que a obra de arte sublime era aquela que nos aterrava pela sua grandeza (lembremos a verticalidade avassaladora da arquitectura barroca, por exemplo, que inspiraria a obediência no crente, esmagado por Deus). Assim sendo, a obra de Eisenman é um acto perlocutório, que nos afronta, apoderando-se do nosso medo, que nos apequena. Também aqui a arte veicula determinados valores sociais – não se compare estritamente a visão de Burke da arte com a que vislumbramos em Eisenman, pois, para aquele, a arte insere-se num projecto político conservador e ditatorial. O que dizemos é que a obra de Eisenman, à sua maneira, é uma advertência, que apequenando-nos, homenageia a democracia, e lança um anátema sobre a cultura ocidental, que reproduz iguais e aterrorizadoras mercadorias. Também aqui é o muito que cria o efeito, e em que o muito tem valor, apesar de a quantidade aumentar insuportavelmente o vazio que representa.

Quem entra neste labirinto, não mais é o mesmo. E o termo «labirinto» não será de todo inocente, posto, mesmo no barroco, represente um processo gnoseológico, em que o leitor, ou aqui o fruidor de arte, descobre. As mais das vezes, esta descoberta era a sua própria limitação, a irredutível condição de um «ser-para-a-morte». Tanto num como na outra, quem constrói a obra de arte, dela extraindo saber, é quem a frui.» (Pedro Meneses)

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